José Dari Krein e Renata Dutra | Outras Palavras
Para começar a discutir o que são “velhas questões”, pode-se reportar à realidade do século XX ou, quiçá, do século XIX. O que diferencia os dois? No século XIX, havia a compreensão predominante que qualquer direito ou proteção social era algo prejudicial ao desenvolvimento capitalista. Como consequência, prevalecia um sistema de relações absolutamente flexível, em que o poder de determinar as condições de trabalho era exclusivo do arbítrio do empregador. Algo muito próximo do que é defendido em texto editorial da Folha de São Paulo, publicado em 15/10/2023 e subscrito por Adriano Machado (Reuters) sob o sugestivo título “Ecos varguistas”.
No século XX, fruto do avanço da democracia social, houve um entendimento da necessidade de preservar a dignidade das pessoas que precisavam trabalhar para sobreviver, o que ficou expresso, por exemplo, nas convenções da OIT. Prevaleceu, então, uma compreensão de que o mundo não se reduz à dimensão econômica, sendo necessário resguardar outras dimensões da vida humana. Por isso, surgiram os direitos sociais, as leis trabalhistas e o reconhecimento dos sindicatos.
Na atualidade, a defesa de uma sociedade sem direitos e proteções sociais volta à cena, sob a falsa alegação de que as mudanças tecnológicas e produtivas o exigem. O problema é que ideias como as defendidas no editorial mencionado remontam ao século XIX, retrocedem mesmo em relação ao ideário do século XX, que informa a era Vargas no Brasil, quando se constituiu uma legislação inspirada nos países centrais e na doutrina humanista cristã. Diferentemente do que se defende ali, a questão não é negar as mudanças, que são reais, mas compreender que as relações sociais e a forma como se organiza a economia, são expressões não apenas da tecnologia ou das transformações produtivas, mas também das relações de poder presentes na sociedade.
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