A pandemia e o trabalho de motoristas e de entregadores por aplicativo no Brasil

São Paulo, SP. 01 de julho de 2020 greve dos entregadores de aplicativos - Av paulista, - Foto: Roberto Parizotti/Fotos Publicas

Marcelo Manzano e André Krein

Apesar do mercado de trabalho brasileiro nunca ter passado por um processo de estruturação de fato e historicamente ser marcado pela forte presença da informalidade, de 2003 a 2014 foi possível observar um crescimento do emprego e um processo de formalização do trabalho no país, ainda que esse movimento tenha tido contradições. A partir de 2015, contudo, com a crise econômica impulsionada pela política de austeridade e as reformas de orientação liberal que se seguiram (a lei do Teto de Gastos de dezembro de 2016, a Reforma trabalhista de novembro de 2017 e a Reforma da Previdência de novembro de 2019), o desemprego dobrou e permaneceu em patamar superior aos 11%, a subutilização da força de trabalho alcançou 1/4 da população ativa e houve uma proliferação do número de trabalhadores em ocupações precárias, bem como um aumento da exploração do trabalho.

Nesse contexto, nos últimos anos duas ocupações têm despontado como expressões dramáticas do novo metabolismo do mercado de trabalho: os motoristas e os entregadores por aplicativos. Empresas como Uber, Cabify, 99, iFood, Rappi, Loggi, entre outras, se apresentam como empresas de tecnologia que ofertam sistemas de conexão entre entes econômicos independentes, sejam elas entre motoristas e passageiros ou entre estabelecimentos, entregadores e consumidores. De acordo com o posicionamento das empresas, enquanto alegam que os(as) trabalhadores(as) oferecem seus serviços de forma autônoma e voluntária, tratam também de se desincumbirem das responsabilidades inerentes às atividades capitalistas, tanto no que se refere aos custos de aquisição dos meios de produção e dos custos operacionais, bem como no que diz respeito ao reconhecimento de direitos, garantias e condições mínimas de trabalho (Antunes e Filgueiras, 2020, p. 32). Noutros termos, pode-se dizer que ao transformarem uma relação de trabalho (na qual o trabalhador ocupa sempre posição de subordinação e em condição de hipossuficiência) em uma falsa operação comercial, aquelas empresas de aplicativos estão em realidade transferindo o risco capitalista (o qual, em última instância, serve de justificativa ética para o lucro) para o agente não capitalista, isto é, o trabalhador que não tem como arcar com os riscos econômicos dos empreendimentos, pois vive no limite da sobrevivência.

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